quarta-feira, 29 de abril de 2009

ENSINAMENTOS SOBRE A CRISE. SERÁ? (1)

O texto a seguir foi extraído do sítio do Ministério das Relações Exteriores, em sua resenha de notícias. É um artigo escrito por André Lara Resende, divido em nove partes, e publicado originalmente no jornal Valor Econômico.
Tem um pouco de "economês", mas fácil de ser entendido.
O blog Fala Marisco! orienta que seja lido com profundo senso crítico, pois o artigo deixa transparecer muito do preconceito que a elite brasileira, retrógrada e entreguista, sempre impingiu ao povo brasileiro: eles, seres superiores, a nata da sociedade internacional, e nós outros mera ralé, que insiste em sobreviver e viver a atrapalhá-los.

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Jornal Valor Econômico

Título: Além da crise: desequilíbrio e credibilidade
Data: 24/04/2009
Crédito: André Lara Resende

A recuperação global depende de uma agenda de coordenação que abra espaço para a reversão de desajustes macroeconômicos e recomposição da confiança em países e moedas.

Valor Econômico


Por André Lara Resende*

1 - Nas últimas três décadas do século passado, consolidou-se uma visão do que constitui a boa prática de política macroeconômica. A melhor forma de condução das políticas monetária, fiscal e cambial, inspiradas no que se poderia chamar de consenso macroeconômico, parecia ter levado, se não à superação completa, a uma significativa moderação dos ciclos econômicos. A alternância histórica entre fases de crescimento e bonança e fases de recessão e agruras parecia ter sido substituída por um horizonte de crescimento contínuo, sem o espectro da recessão e do desemprego. As autoridades econômicas, os bancos centrais em particular, teriam finalmente dominado a tecnologia para evitar as grandes recessões e o desemprego extraordinário. Para os países centrais, os tradicionais limites macroeconômicos, externo e interno, representados pela capacidade de crescer sem esgotar as fontes de financiamento externo e sem despertar o dragão inflacionário, pareciam ter sido suficientemente afastados, para não mais representarem uma restrição efetiva ao crescimento sustentável.

Para os países emergentes, para os quais a confiança dos investidores internacionais ainda era condicional, isso não era verdade, como demonstraram as crises recorrentes por que passaram nas últimas três décadas. O fato de que economias periféricas não tivessem alcançado o nirvana da grande moderação macroeconômica e continuassem sujeitas a grandes crises de balanço de pagamentos, ainda que tivessem adotado o receituário da grande síntese macroeconômica, era visto apenas como sinal de que ainda precisavam de reformas institucionais e de tempo para a consolidação da confiança. Nos países periféricos, consolidar a confiança externa era objetivo primordial. Após o eclodir das crises, apesar da desvalorização da moeda, da interrupção dos fluxos de capitais externos, da desorganização econômica e do desemprego, a política macroeconômica era obrigatoriamente voltada para a recuperação da confiança. Políticas monetárias e fiscais contracionistas, para o restabelecimento da confiança externa, são especialmente perversas quando a economia mergulha em recessão, as empresas enfrentam grandes dificuldades, o sistema bancário se encontra ameaçado e há grande aumento do desemprego. Para as economias periféricas, entretanto, nunca houve condescendência: em caso de crise, a política econômica não poderia ser anticíclica, dirigida para minorar os seus efeitos, mas perversamente pró-cíclica, para restabelecer a confiança abalada.

Enquanto as economias centrais tinham a impressão de que os limites do possível haviam sido de tal forma ampliados que não representavam mais restrições ao crescimento da demanda, os países periféricos tomavam lições dolorosas sobre os riscos de se aproximarem dos geniosos limites da restrição externa. As várias crises da Rússia e dos países da América Latina e da Ásia não deixaram alternativa: para os emergentes que desejassem participar da integração econômica mundial, beneficiar-se da expansão do comércio e do investimento internacional, era preciso precaver-se contra a possibilidade de serem atropelados por crises cambiais. As consequências seriam dolorosas e, a menos que se tomasse o caminho do isolamento, seriam impedidos de conduzir políticas macroeconômicas compensatórias, após o eclodir da crise.

*André Lara Resende, economista, colaborou na formulação dos planos Cruzado e Real. Foi diretor do Banco Central e presidente do BNDES no governo de Fernando Henrique Cardoso.

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